Durante muito tempo, escrever era, para mim, também tentar caber. Caber nas regras do mercado literário, caber nas expectativas do que “uma boa escritora” deveria produzir, caber nos moldes de um mundo editorial que parece sempre exigir mais do que oferece.
Comecei a escrever com 14 anos. E, desde então, passei quase três décadas tentando responder a um padrão. A escrita se tornou ofício, paixão, ferida e resposta. Mas também foi cobrança, esforço, vigilância. Eu me perguntava: isso agrada? Isso serve? Isso vende? Isso se encaixa? E enquanto escrevia, ouvia ecos dessas perguntas dentro e fora de mim.
Só nos últimos quatro ou cinco anos comecei a desfazer esse pacto. Decidi que não viveria mais para atender às regras de um jogo que me adoecia. Não porque deixei de amar a escrita, mas porque precisei reaprender a amá-la fora do cansaço.
Percebi que o cansaço não é onde a escrita mora.
Ele pode até parecer um atalho porque exige menos da nossa escuta e mais da nossa performance. Mas é um atalho que custa caro.
Custa o prazer de escrever.
Custa a curiosidade.
Custa o tempo de maturação de uma frase que precisa respirar antes de nascer.
Hoje, quando percebo que estou tentando acelerar um processo, quando a escrita ameaça virar produto antes de ser presença, eu paro. Não por fraqueza. Por força. Porque já fui forte demais por tempo demais. Forte ao ponto de escrever mesmo quando doía, mesmo quando não fazia sentido, mesmo quando o texto era só esforço.
Agora, eu escolho outro caminho. Escrevo do meu tempo. Publico no meu ritmo.
Construo uma carreira que me respeita e não que me devora.
Há quem diga que isso é renúncia e sobrevivência. Eu digo que é viver. Finalmente VIVO a escrita.
E nesse processo aprendi que a escrita não mora na sobrevivência. Ela mora no silêncio onde o corpo finalmente pode contar sua história pela primeira vez sem buscar satisfazer terceiros. A escrita mora no intervalo onde a palavra enquanto gesto intransferível de criação.
Hoje eu escrevo porque enfim posso respirar.
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